Do Jornal de Brasília

A cada duas horas, um carro roubado pode ter sido destinado a clonagem somente neste ano no Distrito Federal. Isso representa uma média de quase 11 casos diários ou 300 mensais – foram aproximadamente mil registrados nos três primeiros meses de 2017. O mercado, vantajoso aos criminosos, pode render um lucro que ultrapassa 900%. Geralmente, são ladrões que já têm passagens pela polícia e seguem nas ruas fomentando o mercado do crime, uma vez que veículos adulterados são usados constantemente para delitos. Ontem, a polícia anunciou a prisão de um homem considerado o maior adulterador do DF.

A Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos (DRFV) da Polícia Civil mantém investigações constantes a respeito da atuação desses criminosos. No ano passado, cinco grupos foram desarticulados e 33 carros apreendidos por mês pelas equipes comandadas pelo delegado Marco Aurélio Vergílio.
Entre 1º de janeiro e 31 de março deste ano, 1.404 veículos foram roubados. A maioria, segundo o delegado, é destinada a clonagem – um índice que chega a 70%. “Às vezes a gente recupera carro que não fora adulterado ainda, mas claramente estava esperando pelo momento oportuno. Seis em cada dez veículos roubados são localizados. Destes, a metade já passou por modificações”, explica o delegado.

Não há padrão de serviço. Existem desde falsificadores amadores a especializados. Os veículos, clonados ou em processo, são encontrados em oficinas, galpões, quintais e até empresas de fachada. Eles já não forjam documentos. Usam papéis originais furtados do Detran. Um grupo desarticulado neste ano tinha cerca de 300 unidades onde era necessário apenas inserir as características dos veículos.

Rompendo barreiras

“Os grupos rompem barreiras com uma atuação interestadual. O DF acaba sendo um grande fornecedor de veículos a vários estados, como Goiás, Tocantins e Minas Gerais, mas chega a distâncias maiores”, revela. A delegacia especializada diz que a atuação desses criminosos é controlada com a prisão de diversos responsáveis. De acordo com Vergílio, diversos segmentos da criminalidade preferem pegar um veículo clonado para pôr em prática outros delitos.

“Durante as investigações, além de responsabilizar o autor do crime de assalto, quero entender para quem está fornecendo esse carro, para onde está indo, se alguém encomendou e se praticou crime para que a gente possa fazer uma repressão qualificada”, relata o delegado. De acordo com ele, muitos receptadores colaboram na esperança de responder em liberdade, já que é um crime mais leve e dificilmente leva à reclusão – a menos que tenha envolvimento direto com o grupo criminoso.

“O que menos lucra é quem subtrai o bem, papel executado por muitos adolescentes. Quem tem margem de lucro maior é o adulterador”, afirma o delegado Marco Aurélio Vergílio. Isso porque o veículo é adquirido por R$ 1 mil ou R$ 2 mil e revendido por R$ 5 mil a R$ 10 mil. “Essa margem é maior porque não é qualquer um que pode fazer falsificação, que se expõe na aquisição de placas”, ressalta.

“Chefe” preso ao negociar Audi A5

Considerado o maior adulterador de veículos do DF, Carlos Alberto Nascimento de Abreu, conhecido como Carlinhos, 42 anos, foi preso com dois comparsas pela DRFV. “O histórico criminal dele vem desde 1996. Em 2015, houve a necessidade de fazer uma investigação voltada ao seu trabalho”, relatou Marco Antônio Vergílio.

Foram apreendidos três veículos clonados: um Audi A5 Sport, um Fiat Strada e um Ford Fiesta. Os instrumentos para a falsificação eram diversos: lixadeiras, jogos de pino de punção numérico e alfabético, etiquetas veiculares e vários pares de placas. Os demais presos são Saywre Rios Santos Silva, 22, e Josiel Pereira, 39, conhecido como Titi.

“Carlinhos prestava o serviço de adulteração a diversos criminosos do DF, em Samambaia e Ceilândia. Ele já havia deixado rastros dos crimes por outros estados. Na Bahia, Goiás e Tocantins, a polícia havia detectado outros casos comandados por Carlos. Seus crimes somam quase 20 passagens”, diz Vergílio.

O principal suspeito foi preso na Feira Permanente de Samambaia quando aguardava a chegada do comparsa Josiel, para negociar a venda do Audi com receptadores.

Orientações

O Detran recebeu um pedido de apuração referente a carros clonados por mês neste ano. A mesma média foi registrada no ano passado. Segundo Uelson Praseres, diretor de Controle de Condutores e Veículos da autarquia, é necessário apresentar requerimento formal para que os casos sejam conhecidos e apurados. No protocolo da sede do órgão, na Asa Norte, abre-se o processo de investigação com todos os documentos que possam provar o crime, como boletim de ocorrência e cópia de infração que possa ter recebido indevidamente.

“A partir da constatação da clonagem, tudo é cancelado e inicia-se o procedimento de troca de placa”, explica Uelson Praseres. A orientação é efetuar o recurso de multa simultaneamente.

O delegado da DRFV recomenda atenção redobrada ao comprar veículos, especialmente quando o negócio é feito sem intermédio de estabelecimentos: “Exija contato direto com o proprietário, mesmo que a pessoa diga que comprou e não fez a transferência. Também vale verificar se a documentação foi emitida pelo Detran”. A Polícia Civil faz vistoria preventiva agendada, por R$ 75.

No ano passado, o DF registrou média de 12 carros clonados por mês. O número representou um aumento de 60% em relação a 2015, conforme informou o Detran. Na maioria dos casos, os donos só descobrem a clonagem quando começam a chegar as multas.

Outros destinos dos carros roubados são desmanche, em que 20% são usados para aproveitamento de peças. Cerca de 10% não chegam a sofrer dano e geralmente são abandonados após o uso – seja para transporte, seja para delitos.

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