O número de detentos infectados com doenças de pele na Papuda, no Distrito Federal, subiu de 2.095 para 2.601 na última semana, um aumento de 25%. A doença atinge cinco das seis penitenciárias do Complexo da Papuda. O total de infectados representa 17% da população carcerária.
Um agente de polícia de custódia também foi infectado, segundo informou o Sindicato da Policiais Civis do DF (Sinpol). A diretora de assuntos sindicais do Sinpol, Marcele Alcântara, disse que o agente trabalha no Centro de Progressão Penitenciária (CPP), no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA). De acordo com o Sinpol, o servidor teria sido contaminado por algum preso que estava alojado na carceragem, destinada aos detentos do regime semiaberto.
Em nota enviada ao G1, a Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe) confirmou que um agente policial de custódia lotado no Centro de Progressão Penitenciária foi afastado no período de 24 de julho a 31 de julho para tratamento de impetigo (que é uma doença de pele).
“Tal afastamento não indica que o servidor foi contaminado no ambiente de trabalho, pois até a última triagem feita pela equipe médica não foi registrado casos de impetigo em nenhuma unidade prisional”, diz a nota.
Segundo a Sesipe, das cinco unidades prisionais onde houve diagnóstico de escabiose, tineas, ptiríase e furunculoses, “o CPP foi a que menos registrou sentenciados acometidos por tais doenças de pele”. De acordo com pasta, dos 1.319 detentos que passaram pela triagem nessa unidade, 10 foram identificados com as doenças e já passaram por tratamento médico.
A diretora de assuntos sindicais do Sinpol diz que o agente contaminado está prestes a se aposentar e que é um servidor experiente. Marcele explicou ainda que o funcionário está tomando antibióticos para combater a infecção.
“Não podemos dizer que foi uma irresponsabilidade do policial. O ambiente é que está muito contaminado.”
O sindicato enviou um ofício à Secretaria de Segurança Pública e à Subsecretaria do Sistema Penitenciário pedindo providência imediata para que “medidas profiláticas” sejam tomadas para preservar a saúde dos policiais civis que trabalham nas unidades do sistema penitenciário.
A doença surgiu na Papuda em julho passado. Em 14 de julho, a Secretaria de Segurança Pública informou ao G1 que havia 692 doentes em apenas duas unidades – Centro de Detenção Provisória e Penitenciária I. Desde então, o número ficou quatro vezes maior e foram detectados doentes em outros três prédios. Apenas na Penitenciária Feminina ainda não foi registrado nenhum caso.
Até o momento, 14 mil detentos passaram por triagem. A SSP nega que haja “epidemia” e informou, por nota, que não foi informada sobre visitantes contaminados e, por isso, não há motivos para suspender as visitas.
“Não se deve afirmar que houve, ao longo dos últimos dias, um aumento de tais casos. Isso porque, dia a dia, a Gerência de Saúde da Subsecretaria do Sistema Penitenciário – composta por profissionais da Secretaria de Saúde – realizou as triagens em cada unidade prisional. Com isso, os números iam sendo atualizados a cada avaliação.”
O complexo da Papuda tem capacidade para abrigar 7.496 presos, mas hospeda, em média, 15 mil detentos.
A Secretaria de Segurança pública também afirmou que a doença está sob controle e que todos os presos diagnosticados com doenças de pele estão em tratamento. Contudo, representantes do Conselho de Direitos Humanos do DF e da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados estiveram no complexo prisional na última sexta (28) e afirmaram o contrário.
Segundo o presidente do Conselho de Direitos Humanos do DF, Michel Platini, não há remédios adequados para o tratamento e nem todos foram medicados.
“Eles estavam apenas tratando os sintomas, mas não tinha o medicamento adequado para tratar as doenças. Com esse nível de alastramento, todos os internos deveriam estar sendo medicados. Se esse ciclo de transmissão não for rompido vai deixar mais gente doente.”
Ao G1, a SSP afirmou que a visita da comitiva ocorreu no momento em que ainda estava sendo realizada a triagem dos internos e, no fim da tarde da última sexta, todos os internos diagnosticados já haviam recebido tratamento.
O caso está sendo acompanhado pelo Ministério Público do DF, que enviou recomendação à Secretaria de Segurança Pública para que ações de combate às doenças sejam cumpridas com rigor. Entre elas, banho de sol diário, estoque de medicamentos para o tratamento, lavagem diária da roupa de cama e higienização das algemas e mãos dos detentos.
Platini diz, no entanto, que nem todas as recomendações foram cumpridas.
“O Centro de Detenção Provisória é a porta de entrada da cadeia. Isso favorece que as pessoas adquiram a doença lá e levem para as outras unidades. Além disso, os presos não estavam tomando banho de sol e tinha uma médica atendendo muitos presos.”
As doenças identificadas pela Secretaria de Saúde no dia 14 de julho eram a escabiose e o impetigo, infecções de pele provocadas por ácaros e bactérias. No entanto, a Secretaria de Segurança Pública informou ao G1 que o impetigo foi descartado por médicos da unidade, mas que outras três doenças foram detectadas – tineas, ptiríase e furunculoses.
Todas elas têm maior chance de proliferação em ambientes fechados com aglomeração de pessoas, como escolas, creches, quartéis e presídios.
A infectologista Eliana Coutinho explicou que é possível tratar as doenças sem precisar isolar os detentos. No entanto, segundo ela, o cenário de superlotação pode comprometer esse tratamento.
“Algumas dessas doenças são tratadas com antibiótico e a higiene pessoal e do ambiente. A higiene tem que ser bem guardada, com roupas de cama próprias e lavadas diariamente por um período, mas não precisa isolar a pessoa. Agora, se não for possível garantir esses cuidados vai ter que isolar mesmo.”
“A questão é higiene, se dorme coladinho um no outro realmente é difícil o controle. Como controla diante da superlotação?”
Segundo a infectologista, outros presos ainda podem manifestar as doenças, como é o caso de tíneas, doença causada por fungos, e ptiríase, conhecida como “pano branco” que causa manchas e coceiras. As duas podem estar em período de incubação.
* sob supervisão de Maria Helena Martinho.